Cada Tempo em seu Lugar
O tempo é nosso problema - Jorge Luis Borges
Vou discordar do evangelho de João. Acho que antes do
verbo, no princípio era o tempo.
De toda a travessia vivida, fiquei com a
seguinte impressão até agora: sem o tempo de que adianta o verbo?
Embora o tempo esteja em tudo o verbo vem depois da existência do tempo,
singular para cada ser dotado de razão e sensibilidade. Verbo que para
alguns vem antes, para a felicidade e orgulho dos familiares, e para
outros nunca. Mas o tempo, esse chega junto para todos desde o
nascimento.
Escrever
sobre o tempo - não sei porque fui me meter em assunto tão complicado
logo no post de estréia - é coisa difícil, tortuosa, instigante. É o tema mais discutido no percurso da filosofia, junto com as questões do
nascer, viver, morrer e da eternidade, na teologia e nas religiões -
todas elas transversais ao tempo. Mas enfim, tenho admiração, respeito e
fixação pelo tema. Me arrisco, pois aqui não se trata de texto
acadêmico, e embora longe dos meus livros, sou "facilitado" porque vivo
no tempo onde existe o calendário, o relógio, a fotografia, o
video, o cinema, o computador, a internet, o
google, a linha do tempo da rede social, a vida em tempo real. A minha memória.
Consertar o tempo é impossível. Coisa imaginável somente
para relojoeiros - como foram meu bisavô e avô maternos (me lembro do
filme a Invenção de Hugo Cabret). Me contento em concertar. Concertação é
palavra que gosto. Concertar o tempo é uma tentativa de me harmonizar
com ele. Por isso o nome desse espaço de tempo.
Com
o apoio da frase do Borges que escolhi como epígrafe, (ou bengala), me
lembro agora - olha o tempo aí de novo - de autores, artistas que
trataram
desse nosso velho camarada; e em busca rápida vão desde o I Ching - dos
Chineses, no devir/fluir de Heráclito, no Eclesiastes 3 - que aprecio
muito - , no livro XI
das Confissões de Agostinho, no Ser e Tempo de Heidegger, no
espaço/tempo de Einstein e a descoberta da física quântica, no tempo
imaginário de Stephen Hawking,
na obra de Freud e Lacan, a criação e refundação da psicanálise, a
sincronicidade de Jung, a música de Bach, os clássicos dos Beatles:
Yesterday, Let Be, A Day in The Life, o Surrealismo e A persistência da Memória de Dalí, a
fotografia de Cartier Bresson, Roland Barthes e o estudo da fotografia, a
pop art de
Andy Warhol, Matrix - o filme.
Para não dizer que não falei das flores, esperar é saber: o Grande Sertão:Veredas é uma obra permeada sobre a questão do tempo.
Érico Veríssimo nos legou o Tempo e o Vento, Fernando Sabino o seu
Encontro Marcado, Carlos Drummond de Andrade os poemas Nosso Tempo, O
tempo passa? Não Passa, Os ombros suportam o mundo, e tantos outros
poemas nas fases, (tempos), dele, Drummond. Bartolomeu Campos de Queirós
- que sempre me estimulou a tirar os escritos da gaveta -, em seu
filosófico e poético livro com ilustrações inspiradas no surrealismo: Tempo
de Voo. A arte de Arthur Bispo do Rosário produzida nos seus tempos de
isolamento. A monumentalidade no tempo dos traços de Niemeyer.
Sem muita firula e "simplificando": o tempo é a medida da
nossa existência, da nossa memória, do que fomos e do que somos. Feitos e refeitos pelo tempo. A regra do bem viver é
florir e frutificar feito laranjeira, mangueira, bananeira, capim
gordura, feijão; nas chuvas, na vida irrigada. No estio, mandacaru.
Imprevisível o tempo. Ele anda surpreendendo tanto, né? Ora, chove
demais. De repente, longa estiagem, seca. Natureza, vida, existência
aprendem a se adaptar e florir como o mandacaru. Resistimos.
Então uma das possibilidades é negociar com o tempo.
Conciliar, harmonizar. Propor a concertação do tempo lógico - dos
calendários e dos relógios, com o tempo ilógico: da filosofia, da física e da
metafísica, do inconsciente, da atividade e do trabalho que
se faz por paixão - onde não há necessidade de conserto porquanto
transcende horas e datas; o tempo de estar junto com quem a gente ama
e de quem a gente gosta, o
tempo que dura o antes, o durante e o depois do sexo bom, o tempo do
onírico, da fantasia; viajar sem compromisso, mudar de estrada,
contemplar a natureza,
prosear com gente bacana, ficar quieto, ler bons livros,
fotografar aquele instante, ouvir boa
música, plantar e cozinhar o próprio alimento, escrever, reescrever, iniciar um
blog, momentos de
epifania, dormir, sonhar e acordar. Formas de driblar a rudeza deste
senhor tão bonito.
Concertadas as palavras encerro
por aqui para não alongar e tomar mais tempo do leitor e colaborador que quero
cultivar. Dizem que time is money.
Será?
A que veio o Blog?
Duas palavras definiam o tempo para os gregos antigos: chronos e kairós.
Enquanto a primeira referia-se ao tempo cronológico (ou sequencial) que
pode ser medido, essa última significava “o momento certo” ou “oportuno”:
um momento indeterminado, inteiramente interior, no tempo em que algo especial acontece.
Aproveito então 2012 - mais um ano que não terminou -
para entrar na blogosfera. Leitor de livros, das coisas, da vida e
ignorante por minha por própria conta - como gosto de me apresentar -
pretendo que o tempo e lugar deste blog seja um ponto de encontro para
compartilhar idéias, convergências, divergências fraternas, espaço para o
diálogo; e para o embate se necessário.
A prosa é - mais ou menos - diversa, como são meus
interesses: curtir o tempo, pessoas, cotidiano, trivialidades, política:
internacional-nacional-estadual-paroquial, direito, administração
pública, midia, educação, meio ambiente, indios, mata e montanha, rios, ribeirões e
mar, livros, coisas do rosa, quixote e quixotices, filosofia, ética, saúde, psicanálise,
espiritualidade, fotografia, imagens e ilustrações, humor e bom humor, culinária, comida,
cervejas, vinhos, butecos, música, discos, artes, futebol, flamengo, esportes,
cinema, cidades, ciências, arquitetura, urbanismo, design,
flores, antiguidades, tecnologia e o que pintar por aqui.
No link abaixo, extraido do Blog da Música Popular Brasileira da Revista Rolling Stone, você vai encontrar videos de artistas cantando o Tempo. A canção que mais gosto deu nome a este primeiro post: Cada Tempo em seu Lugar. Obra prima do Gil - que eu já gostava muito - veio a calha, no meu tempo hoje; meio como um "viagra" intelectual.
Estique mais um tempinho aí: